Cidades com até 10 mil habitantes recebem mais, por oferecerem mecanismos frágeis de fiscalização, diz Transparência Brasil
Novo levantamento da Transparência Brasil aponta que cidades de até 10 mil habitantes receberão, no mínimo, um total de R$ 1,7 bilhão em emendas Pix em 2024. O valor corresponde a 25% dos R$ 6,9 bilhões desse tipo de recurso já empenhados (reservados) pelo governo federal para municípios até o início de agosto.
Marília irá receber apenas R$ 1.150.000,00, o que corresponde a R$ 4,63 para cada um dos 237.627 habitantes.
Embora sejam o destino de parte tão significativa das transferências especiais, essas cidades de menor porte representam 6% da população de todos os municípios que receberão emendas Pix. São locais onde geralmente os controles interno e externo sobre o gasto público são mais frágeis. No atual contexto de ausência de mecanismos de transparência e rastreabilidade das transferências especiais, são terreno fértil para ineficiência e irregularidades.
Os municípios com menos habitantes devem receber mais recursos este ano do que os populosos, cenário semelhante ao revelado pela TB em 2023. Entre as cidades com até 10 mil habitantes, 466 são o destino, cada uma, de mais de R$ 1 milhão empenhados em emendas Pix. Outras 17 são o destino de mais de R$ 5 milhões.
Com menos de nove mil pessoas, São João da Baliza (RR) é o município de menor porte campeão em emendas Pix este ano. A cidade roraimense deve receber R$ 13,4 milhões, ou R$ 1,5 mil por habitante. O montante é maior que o total empenhado para oito capitais que, juntas, somam 17 milhões de habitantes.
Ao contrário do que acontecia desde 2020, este ano as prefeituras beneficiadas com emendas Pix devem indicar na plataforma Transfere.gov em quê o dinheiro será utilizado, para que recebam o pagamento. Ao final do ano, deverão inserir na plataforma documentos comprovando que aplicaram o dinheiro no que havia sido indicado por elas.
As obrigatoriedades foram definidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2024, por sugestão da TB e de outros atores. A Instrução Normativa nº 93/2024 do Tribunal de Contas da União também exige a divulgação do plano de gestão e aplicação dos recursos.
Das 5.570 cidades brasileiras, 82% devem receber emendas Pix em 2024. Todos os municípios de Roraima, Acre e Amapá foram contemplados com recursos. Levantamento anterior da Transparência Brasil evidencia que parlamentares não se dedicam a planejar a finalidade de suas emendas Pix: menos de 1% dos R$ 8,2 bi inseridos na Lei Orçamentária Anual de 2024 identificam o destino e para quê o recurso será utilizado.
As chamadas “emendas Pix”, questionadas no Supremo Tribunal Federal (STF), são recursos com modalidade de “transferência especial” direta para estados, Distrito Federal ou municípios. Ou seja, não há necessidade de celebração de convênio ou instrumento do tipo para os repasses.
Elas fazem parte das emendas parlamentares individuais, que são indicadas por cada deputado e senador. Essas emendas, identificadas como “RP6” no Orçamento, são de pagamento impositivo, ou seja, obrigatório.
As “emendas Pix” são alvo de impasse entre o Congresso e o Judiciário. A Procuradoria- Geral da República (PGR) pediu ao STF que declare inconstitucional essa modalidade de transferência. A TB considera que o reconhecimento da inconstitucionalidade das emendas Pix pelo Supremo Tribunal Federal é a solução mais adequada para os problemas dessa modalidade de repasse. Como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7688, proposta pela Abraji, a TB fornecerá informações para contribuir com a decisão sobre o caso.